"A Rapariga Que Lia no Metro" de Christine Féret-Fleury (Opinião)

Livros que falam de livros e leitores são a minha perdição. Não deixo escapar nenhum! Por essa razão, este “A Rapariga Que Lia no Metro” também teve de vir parar cá a casa.

Para começar, adoro o título. É a premissa de uma boa aventura livresca, embora a história depois fuja um pouco à ideia inicial. E a capa? Simples e cativante, não acham?
Boa aposta, Porto Editora! 😉

Bem, assim que as palavras começam a povoar a primeira página do capítulo I, fiquei imediatamente fisgada.

Juliette é uma jovem que apanha todos os dias o mesmo metro rumo ao emprego. Ela tem o adorável vício de bisbilhotar os livros que os outros passageiros vão a ler – quem não o fez que atire o primeiro livro! lol. Gosta de imaginar as suas vidas, ricas e preenchidas, bem diferentes da sua, que nada tem de especial. Juliette trabalha numa agência imobiliária e os dias são todos iguais.
Um dia, por acaso, ela muda de trajeto e aí a sua vida vai mudar radicalmente.

Deparamo-nos então com uma bela história, a roçar o fantástico, com imensas referências literárias que enriquece de sobremaneira a narrativa. Para além de falar sobre livros de uma forma generalista, também especifica alguns que, obviamente, aquecem o coração de qualquer leitor. O primeiro a saltar-me à vista foi um livro que adorei “Rebecca” de Daphne Du Maurier, cujo destino do exemplar que cai nas mãos de Juliette é bem interessante.

O texto, escrito com uma fluidez e meiguice inesperadas, é delicioso:

«Juliette deu mais três passos e estendeu o braço, roçando as folhas curvadas pela humidade. Com a ponta da língua humedeceu o lábio superior. Ver um livro entalado entre dois painéis de metal provocava-lhe um sofrimento que era quase superior ao de afogar uma aranha. Suavemente, encostou o ombro a um dos batentes e empurrou; o volume deslizou um pouco mais para baixo. Apanhou-o e, mantendo-se encostada à porta, abriu-o e aproximou-o do rosto.

Sempre gostara de cheirar os livros, de os farejar, sobretudo quando os comprava em segunda mão – os livros novos também tinham odores diferentes consoante o papel e a cola utilizados, mas ficavam mudos em relação às mãos que os haviam segurado, às casas que os haviam abrigado; ainda não tinham história, uma história bem diferente daquela que contavam, uma história paralela, difusa, secreta. Alguns cheiravam a mofo, outros guardavam entre as suas páginas vestígios tenazes de caril, de chá ou de pétalas secas; manchas de manteiga sujavam por vezes a sequência; uma erva comprida, que desempenhara o papel de marcador durante toda uma tarde de verão, desfazia-se em pó; frases sublinhadas ou anotações à margem reconstituíam, em pontilhado, uma espécie de diário íntimo, um esboço de biografia, por vezes o testemunho de uma indignação, de uma rotura.

Aquele cheirava a rua – uma mistura de ferrugem e fumo, de guano, de pneus queimados. Mas também, e isso era espantoso, a menta. Alguns caules destacaram-se do vinco, caíram sem ruído e o perfume tornou-se mais intenso.»

É sem dúvida uma pequena pérola para os amantes dos livros. Não concordam?
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